Parte
4
Lystvianka / Lago Baikal
Cheguei
nele. Vim de van, de carona, passando aperto e com medo de morrer.
Motorista louco: quando de carona geralmente a gente não reclama,
mas e se eu quisesse reclamar? De novo eu estava incomunicável, e eu
rezei depois de anos e anos pra chegar.
Guimarães
Rosa dizia que viver é negócio perigoso. Aqui é mais. E toda
cagada tem um início, e essa se iniciou pelo fato de ter encontrado
no ponto de carona em Irkutsky um eslovaco chamado Pedro.
Ele fala 5 línguas, e um pouco de russo. Ótimo. E ele deu a ideia
de pararmos no meio do caminho, antes do lago, no meio da floresta de
Taiga, para conhecermos uma civilização siberiana que vive em casas
de madeira há 200 anos, como se fosse um forte medieval, chamada de
TALTSY,
incrível, e eu já tinha ouvido falar, mas só acessível para não
sei quem - talvez quem fale russo, e peça pro motorista da van parar
perto da porteira na beira da rodovia. Então, depois de 50 minutos
de viagem, o motorista da van lotada parou, e o Pedro falou apressado
pra mim, vamos, é aqui, você não vem?
E
então eu disse pra ele: - É aqui mesmo? E ele me confirmou; Aí eu
falei sim!!! O problema foi o seguinte, a van tinha umas cortinas
bloqueando a visão das janelas, e eu não havia aberto a cortina
para não acordar as pessoas dormindo e por isso eu não sabia a
situação do lugar que me encontrava. Pronto, cagada feita, desci da
van, e ela foi pro LAGO.
Primeira coisa que me veio na cabeça foi minha mãe, que dizia quando criança pra não pegar carona com estranhos, não aceitar bala dos outros e não descer antes do destino final, pois me lembrei naquele segundo que pisei fora da van quando ia de ônibus pra BH sozinho e ela me dizia pra não descer antes em Carmópolis.
Gelei,
pois era só mato, a rodovia, e uma porteira que descia pra não sei
aonde. E torci pro Pedro não querer me matar ou roubar. Qualquer
coisa seria correr, e eu corro bem, e de nervoso comecei a rir
sozinho, pois pensei em que direção eu correria se fosse
necessário, e não adiantaria correr para o fim do mundo, pois eu já
estava lá.
Mas
o Pedro era legal, gente boa, e depois de conhecermos tudo perguntei
pra ele como voltaríamos em direção de Listvianka, já que a van
suicida se fora, e ele disse calmamente, “voltamos pra estrada e
pedimos carona novamente”. Minha ultima carona pondo o dedão ao
alto foi no morro do tiro de guerra em Lavras, vinte e cinco anos
atrás, que ficava a cinquenta metros da minha casa.
Agora
eu estava na beira da estrada esperando carona, na rodovia
transiberiana. E a cagada continua, já que começou a chover e a
temperatura que eu tinha visto no dia anterior que seria por volta de
19 a 24 graus, foi pro saco, e chegou perto de nove. A anta aqui
estava de bermuda, levava protetor solar, uma cueca seca pra trocar
se eu nadasse no lago e uma jaqueta fina da north face. Nunca vi um
sujeito passar tanto frio por tanto tempo igual eu passei.
Enfim
cheguei ao Lago Baikal, deixei de sentir frio, e comecei a realizar
de forma lenta que eu estava lá. Coloquei a mão na água, estava
congelante mesmo no verão, passei a água em minha cara, e bebi a
água mais pura do lago mais antigo e mítico do mundo.
Na
beira do lago, eu estava muito mal, gripe forte, fome, e fui comer o
peixe que só existe aqui, chamado Omul,
muito famoso, e comi com garoa na cabeça. Cachorros e gatos em
volta, sentado e esgotado, com a mão engordurada comendo o peixe
segurando com um saquinho que ele vinha embrulhado. Melhor peixe que
já comi na minha vida, ele parece um Haddock, só que defumado e
carne branca e um cheiro que você lembra por muito tempo. Comer
peixe gripado e molhado com animais em volta é muito bom.
Inesquecível!
Tinha
que voltar, portanto, pegar carona novamente, e o Pedro não iria, já
que ele dormiria por lá pra viajar no dia seguinte pro norte do
lago. Sozinho de novo.
Foda mesmo é entrar na van com russos, sem falar russo, e dizer em russo, e isso eu fiz: - OI, IRKUTSKY POR FAVOR (привет пожалуйста, Иркутский), e deu certo, depois de 2 horas cortando prego, com medo de bater, capotar, cheguei a Irkutsky novamente. Por favor evitem andar de carro com russos. Geralmente estão bêbados.
E
antes de me despedir do Pedro, perguntei se ficar parado na estrada
era perigoso, ele disse que não, mas disse que não é muito raro
ver ursos pardos aqui, e que não adianta correr deles. E lembrei que
ursos com fome comem gente. Mas deu certo, eu finalmente realizei meu
sonho e conheci o Lago.
Stenio
Para quem tinha medo da cuca do sítio do pica pau amarelo, vc evoluiu bastante! Mas prefiro a cuca do que seu amigo ai, eu ia ajudar a te procurar, pode ficar tranquilo!
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